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o novelo de odradek | victor paes


onde você esconde sua humanidade?

 

 

 

O ser humano sua é de humanidade.
O ser humano sua pela língua, como os cachorros.
Mas os cachorros não inventam o próprio rabo.

 

Adelaide Freni
 

1

Que tanta humanidade se admira escrita por aí? É a velha maquinaria do dente exceção em roda regra. Se a reta é invenção humana, qual curva deixa de ser humana por isso? O que deixou de ser humano? Diz-se que o próprio humano. Mas então e os direitos humanos, onde ficam? Piadas burras à parte, um direito não é criado para justificar a falta de outro direito? Que tudo se cumpra na sua paz, que a minha já é minha. Tudo não é mais que cumprir. Pois se até a arte já é cumprimento de sensações, nada mais pode deixar de ser. Arte não é necessidade.
 


2

Que humanidade há em uma pintura abstrata? E por que ninguém chama um poema de abstrato? É que formas e cores são no máximo sinais de sagacidade no vestuário. Ninguém está disposto a arriscar as próprias palavras. É o medo de que o abstrato exista...
 


3

Então, tudo bem, vamos exorcizar o abstrato, cumprindo-o. Um gole, um cheiro e um susto! Não. Não é isso simplesmente porque o abstrato só é abstrato se chegar ao concreto. São apenas duas palavras confortáveis para figurativo e não-figurativo. E já que nada é figurativo a partir do momento inevitável em que alcança o não-figurativo, só aí é que passa a se chamar figurativo. Pois ninguém está disposto a perder palavras. Pois reconhecer duas palavras como uma parece ser reconhecer dois conceitos como um, e aí está o grande medo: ao reconhecer dois conceitos como um, é obrigatório se reconhecer que são conceitos e que são exatamente do tamanho de sua fragilidade.
 


4

Então, exigir humanidade em uma obra de arte, ainda mais em um poema, é exigir o óbvio. É exigir aquilo que está perante. É gritar por um grito e depois agüentar calado a avalanche...
 


5

Tudo pode faltar em uma obra de arte. Pode faltar mesmo a própria obra. Todo processo de desautomatização carrega já em si humanidade. O resultado pode ser insípido, mas nunca vai ser vazio. Então o que causa a sensação de vazio? Muitas vezes é o excesso de humanidade...



 

VICTOR PAES é escritor, ator e professor. Foi premiado pelo Prêmio Jovem Artista, da Rioarte, com o texto teatral Os Cálices do Deus, que depois foi apresentado no Projeto Nova Dramaturgia. Foi publicado pela Editora Record, na coletânea do Prêmio Nossa Gente, Nossas Letras, da Oldemburg. Integra e faz a direção cênica do grupo instrumental Arranjos para Assobio.

 


 

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