|
|

|

marco polo guimarães
11 poemas inéditos - em dois
blocos distintos
beira do rio
Isso que te fere
Isso que te vara
É a verdade na vera
É a garra da tua própria fera
Escondida debaixo do sofá da sala
Isso que te varre
Isso que te vira
É a vontade da fúria
É o ouriço guardado na caixa
De vidro que esqueceste na maré baixa
Isso que te persegue pela madrugada
Essas sombras que ziguezagueiam na vista
Essa pista de fuga e partida, esse estrondo
É o som que escutas batendo em tua porta fechada
Isso que revolve a tua pasmaceira
Isso que te pesa na parte esquerda da face
Isso que se entranha em teu gesto e maneira
É a terceira beira do rio que não atravessaste
Berlim
verdecinza verdeverde verdebranco
em terno cinza sobre fundo verde
o carteiro na mão uma carta vermelha
uma fruta vermelha e a gravata branca
verdemar verdechuva verdeaquária
submerso o carteiro uma luva na mão
uma luva negra sobre um fundo cinza
uma cinza que se espalha pela superfície
verdeverdealemão verderroxo verde
abacate tomate e o carteiro alemão
uma carta na chuva e a gravata escorrendo
vermelha uma fruta rolando no chão
verdeverdeverdade sem alarde sem
terno sem nada o carteiro despido
de gestos na grama uma nuvem móvel
cobrindo a superfície roxa negra amarela
Björk
ela vai lambendo os lábios e se
retorcendo na cadeira, são poses
acrobáticas, tensas, felinas:
ela trabalha com seriedade.
"a perfeita expressão do luxo
é deixar o telefone fora do gancho
crer que o paraíso existe no seio
da imaginação e das canções
sair para o jardim às três horas
da manhã e perceber os detalhes
que você não vê, tudo que é frágil
e translúcido como o gelo, tudo
que é pleno de silêncios, murmúrios".
ela diz e depois com uma espécie
de mesura, meio pirueta, meio
genuflexão que a todos desarma
enfia-se num casulo e parte.
estramônio
Planta herbácea, da família das solanáceas
(datura stramonium), tóxica e medicinal,
folhas grandes irregularmente sinuadodentadas,
com dentes compridos e agudos, agudos,
flores alvas ou azuladas, e solitárias,
brotando de ângulos, bifurcações de ramos,
e cujos frutos são cápsulas ovóides,
eriçados de grossos espinhos, espinhos,
que contém sementes amareladas,
que quando maduras, de cor preta;
figueira-brava ou figueira-do-inferno,
mamoninho-bravo, zabumba, zambumba.
***
arara
ruído
da areia
dos erres
raspando
no vôo
rasante
das asas
dos as
o grito
da arara
é cru
é um grito
arrancado
da carne
crua
grito
de brasa
em carne
viva
arara
mão de matisse
na treva verde da noite
a arara rasga luz
na nossa cara
arara
a arara
quando grita
rola um sol
na garganta
pênis
parte mais rígida
de delicada
máquina
de encaixe
vagina
vulnerável válvulavulva
músculo moluscofusco
pequeno planeta de água
lama-sal
fernão persona
ou
arquitetura da máscara
tijolo a tijolo
cimento a cimento
pedra sobre pedra
ergo meu castelo
de vento
fúcsia
cor
ou bufido de gato?
MARCO POLO GUIMARÃES
é jornalista, poeta e compositor. Nasceu no Recife, de pai baiano e mãe
paraense. Foi hippie, artesão, tradutor de livros de bang-bang, cantor de
banda de rock, gerente de supermercado e diretor de museu. Atualmente é
editor da revista Continente Multicultural (www.continentemulticultural.com.br). Publicou os livros Vôo Subterrâneo, Narrativas, Memorial,
Brilho,
Palavra Clara, A Superfície do
Silêncio e Caligrafias. Também cantor e compositor, gravou o disco
Ave Sangria e participou das coletâneas Asas da América – Frevo I e II.
Tem músicas gravadas por Ney Matogrosso, Elba Ramalho, Teca Calazans e
Zezé Motta, entre outros.
voltar ao índice |
imprimir
|